quarta-feira, 15 de julho de 2009

Crescer

Por Gui Campos 17/06/09

Em que momento crescemos? Quando exatamente deixamos de ser crianças e nos transformamos em pessoas chatas e complicadas? Por quê depois de velhos nos afastamos das pessoas que gostamos? Por quê não abraçamos mais? Não consigo me lembrar quando foi que deixei de tratar o outro com carinho.

Uma criança vê no outro um amigo, uma possibilidade de brincadeira. Mesmo que não falem o mesmo idioma são capazes de se entender. Acho que envelhecer é a arte do desentendimento. De fato. É aprender a desconfiar, a ver no outro uma ameaça.

A adolescência é o ponto médio entre esses dois pontos. Sente-se que algo está ficando para trás mas não se sabe ao certo o quê. Algo que já não pode ser recuperado. Acredito que essa coisa é o presente. A época do deixar-se relacionar. E não falo em sentido sexual, mas de amizade mesmo. Com o tempo acabamos aprendendo que nem sempre se podem cumprir as promessas de amizade eterna, pois o pra sempre às vezes dura muito pouco. Aprendemos a lidar com a perda de pessoas queridas, que se vão para longe. Algumas se mudam de cidade, outras de país. Algumas morrem. Avós, tios, tias, amigos... A morte pouco a pouco deixa de ser um personagem de filme de terror para ser o inimigo que está sempre à espreita, ao nosso lado, levando pessoas queridas.

Descobrimos que muitos “até logo” na verdade são “adeus”. Depois de muitos anos distantes, podemos um dia passar ao lado de uma dessas pessoas queridas de tempos atrás e nem sequer reconhecê-las. Isso sem falar nas dores do coração. São tantas lágrimas, tanto vazio, tanto desespero, que pouco a pouco aprendemos a aceitar a impermanência das coisas. E como o fazemos? Sem nos apegar a nada ou ninguém.

Nunca entendi a parte do budismo que fala do desapego. Se não tivesse apego por todas as pessoas que amo (e acredito que o verbo amar não se conjuga no passado) não teria a menor graça viver. Sigo sofrendo a cada dia pelas pessoas que se foram, desde aquele melhor amigo da 2ª série que se mudou pra Goiânia e eu nunca mais vi, à primeira namorada (que se mudou para o exterior) ou às saudades que sinto todos os dias de todos os parentes e amigos que perdi. Uma espécie de síndrome de Diógenes das recordações.

Talvez crescer seja isso, aprender a conviver com a ausência, com a obrigação de aprender a sobreviver só, com o medo cada vez menos imaginário e mais real da morte. Com a desconfiança e o desentendimento, com as paixões e amizades mais racionais e menos viscerais.

Acho que essa é a pior parte. Aprender a conviver com a autoprivação das demonstrações de afeto, mais com o tapinha nas costas e o aperto de mão e menos com o abraço apertado de um bom amigo. É, sem dúvida nós, adultos, deveríamos nos abraçar mais...


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Escrevi esse texto há um mês atrás, viajando de avião de Madrid para Porto. Havia uma criancinha ao meu lado que falava francês e uma no banco de trás que falava português. E apesar de não falarem a mesma língua passaram a viagem toda "conversando". Já eu sou cada vez mais chato e tenho mais preguiça de conversar com as pessoas que viajam do meu lado...

3 comentários:

Clarinha disse...
Este comentário foi removido pelo autor.
Clarinha disse...

Há menos de uma semana, Lisboa era pra mim um bônus: uma escala que duraria um fim de tarde e uma noite, entre Praga e Brasília. Ótima oportunidade pra uma priemira olhadela no Tejo e pra ouvir português com sotaque. O taxista simpático e bonzinho me fez mil recomendações até o hotel, e me cobrou quase quatro vezes o valor de uma corrida normal. Achei alto demais o preço e até questionei, mas confiei na aparente sinceridade do velho. Queria mesmo que o taxi fosse tão caro. Mas não era. Não foi o dinheiro a mais que paguei. Foi a sensação de ter de descofiar das pessoas sempre, de ter de me defender das pessoas. Foi a minha inocência violada que doeu. Sim, crescer dói.
Saudade de você!

leila saads disse...

Dizem por aí que é a educação que nos emburrece.